CERVEJA DE IRATI  
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Cerveja feita em casa é tradição em Irati, no Paraná

LUCIANA GARBIN

 

IRATI – Em Irati, município paranaense a 147 quilômetros de Curitiba, centenas de famílias ainda brindam a chegada do novo ano, celebram o almoço de Páscoa e comemoram aniversários e casamentos com uma bebida trazida no começo do século por imigrantes poloneses, ucranianos e alemães: a cerveja caseira.

 

Lá, polêmicas sobre fusão de grandes cervejarias são coisa de fora, pois o que interessa é ter uma boa receita de cerveja em casa para poder preparar o fermentado doce e espumante, feito de lúpulo e açúcar caramelizado.

 

De teor alcoólico muito baixo – apenas 0,7%, em comparação com cerca de 5% da bebida industrializada –, a cerveja caseira de Irati pode ser encontrada desde em mamadeiras de crianças até em minimercados e festas de terceira idade. Além disso, é considerada uma das principais tradições do município. “Aqui em Irati cada um tem seu cervejeiro predileto e o costume de fazer cerveja em casa passa de mãe para filha”, revela o prefeito Rodrigo Hilgemberg (PFL).

 

Com tanta procura, o município é no Paraná o maior consumidor de lúpulo, uma espécie de planta aromática utilizada na fabricação da bebida. Também instituiu há cinco anos a Festa Nacional da Cerveja Caseira, que ocorre todo mês de dezembro, e registrou, em 1997, a primeira indústria do produto no País.

A primeira edição da festa da cerveja teve dois degustadores de Yakima, cidade norte-americana produtora de lúpulo, e, como prêmio, viagens internacionais. A avaliação levava em conta sabor, aroma, coloração, limpidez e consistência de espuma. O evento reuniu 20 mil pessoas. Em dois dias, foram consumidos 15 mil litros de bebida caseira.

 

A cervejeira Rosecler Garcia, de 49 anos, foi uma das ganhadoras, entre 37 participantes, e até hoje fabrica em casa a cerveja que depois comercializa entre os vizinhos ou na feira da cidade. No verão, ela chega a vender 150 litros por semana. A garrafa descartável de dois litros custa R$ 1,50 e traz uma pequena etiqueta com a data de fabricação. A recomendação é consumir a bebida em até seis meses, porque, após esse período, seu sabor fica muito forte. 

Rosecler aprendeu a receita com a mãe, Florentina Mallmann, de 84 anos, uma neta de alemães que até hoje faz brindes com cerveja caseira em ocasiões especiais. Ela lembra que cada mulher tem uma maneira diferente de preparar a bebida e dificilmente revela seus segredos a pessoas de fora da família. “O resultado é que uma cerveja nunca é igual a outra e cada pessoa sempre acha que a sua é melhor”, garante.

 

As diferenças de sabor podem surgir de detalhes, como a utilização de um ou outro ingrediente. Usar água de uma fonte ou de uma torneira, por exemplo, já influi no sabor. Outro item que precisa ser levado em conta é o tempo de preparo: depois de misturar os ingredientes, é necessário deixar a bebida repousar em latas ou potes de plástico por algum tempo para que o lúpulo fermente. Também se recomenda que, após o engarrafamento, se aguarde sete dias até que a cerveja “chegue ao ponto”. Dizem algumas cervejeiras que se o consumidor agüentar esperar mais três ou quatro meses terá uma bebida de sabor ainda melhor.

 

A dona de casa Denir Amboni Ludivig, de 59 anos, compra alguns litros da cerveja caseira de Rosecler todas as semanas. Segundo ela, a vantagem da bebida é não conter conservantes. “Quando tem festa de aniversário, churrasco ou fim de semana na praia, a gente corre logo para buscar a cerveja caseira, porque ela é mais natural que a outra e o lúpulo é diurético e faz bem para a saúde.”

Para o garçom descendente de alemães Airton Alcione Requião, de 41 anos, o trunfo da bebida típica de Irati é ser mais suave que as outras. “Além disso, também fico feliz em ver gente de fora vindo comprar cerveja caseira aqui”, afirma. “Ela está divulgando o nome da cidade, como se fosse um time de futebol.”

 

O fermentado caseiro, no entanto, também tem seus inconvenientes. Ao contrário das cervejas de garrafa, continua a fermentar mesmo depois de envasado e, se for guardado por muito tempo, seu frasco pode estourar. Além disso, como costuma fazer muita espuma, causa transtornos na hora de abrir a garrafa e não tem muita saída em bares, por conter pouco álcool. “Aqui o pessoal prefere a outra cerveja porque a caseira não deixa bêbado”, conta o dono de uma lanchonete de Irati Alceu Kosinski, de 38 anos.

 

 

Rainha – O primeiro iratiense que tentou produzir e comercializar a cerveja caseira em larga escala foi o engenheiro agrônomo José Luís Pabis, de 41 anos. De olho na aceitação que a bebida tinha na região, Pabis decidiu fazer um teste: depois que a mãe, Bronislava, de 68 anos, conseguiu o terceiro lugar num concurso de cerveja caseira em 1995, pediu a ela que preparasse 200 litros e distribuiu-os por bares da BR-277, que passa perto de Irati.

“Depois de três dias, o pessoal já tinha vendido tudo e estava pedindo mais”, conta. “Então passamos a produzi-la nos fundos de casa.” Em 1997, a família conseguiu o registro do produto no Ministério da Agricultura e lançou oficialmente a marca Krulowa, que, em polonês, significa rainha.

 

Para evitar a concorrência da produção familiar em Irati, Pabis vendia a bebida em embalagens plásticas de um e dois litros para clientes de Curitiba, Guarapuava, União da Vitória e municípios próximos. “Enquanto a cerveja caseira era novidade ela foi uma febre, mas faltou divulgação.”

 

Em 1999, com a explosão do consumo das tubaínas – refrigerantes de tutti fruti vendidos a R$ 0,70 a garrafa –, as vendas de cerveja despencaram. Também foram comprometidas, de acordo com o empresário, pelo aumento de preços, principalmente de produtos importados, como o lúpulo, depois da desvalorização do real. De acordo com Pabis, há quatro anos, a barra prensada com 122 gramas de lúpulo, que hoje custa R$ 9,00, saía por R$ 3,45 e os litros de combustível e fardos de açúcar valiam quase a metade de agora.

Por causa da crise, a empresa da família, que tinha capacidade para produzir 2.400 litros de cerveja caseira por dia e chegou a ter 12 funcionários além dos parentes, está parada há quatro meses.

 

“Continuamos com a firma aberta, mas não estamos produzindo em conseqüência dos custos”, lamenta. “Ainda vou voltar a comercializar a Krulowa, mas faltam investimentos.”

 

 

Casamento – Quem conhece a cultura dos imigrantes de Irati concorda que a cerveja caseira já teve momentos de maior glória. Até meados do século, ela era a bebida oficial dos casamentos da região, sempre realizados pela manhã e acompanhados de um almoço. “Antigamente não existia cerveja de fábrica ou ela era muito cara”, revela Genoveva Zavilinski, de 52 anos, uma das mais ativas participantes da colônia polonesa de Irati. “Então o pessoal rodava pelo salão com bules servindo a cerveja caseira, que era preparada com dias de antecedência.”

 

Além de participar do Grupo Folclórico Polonês Lublin, ela ajudou a fundar o Centro de Tradições Polonesas e comanda, há 15 anos, o programa Godzina Polska (hora polonesa) nas rádios Najuá AM e FM. Desde menina, acostumou-se a beber a cerveja caseira escura ou clara que a mãe e as tias faziam, principalmente em ocasiões especiais.

 

A cervejeira oficial de sua família hoje é a irmã Maria Malinowski, de 62 anos, que aprendeu ainda criança o ofício e agora tenta ensinar aos descendentes o que sabe. “Meus filhos sempre dizem que têm de aprender, mas nunca aprendem”, constata.

 

O desinteresse dos mais jovens faz com que algumas pessoas em Irati temam o fim da tradição em algumas décadas. “Ela corre o risco de desaparecer, porque o pessoal novo acha que dá muito trabalho prepará-la em casa e prefere comprar no bar”, alerta Rosecler.

 

 

Brolhas – Para tentar salvar a cerveja caseira, a prefeitura de Irati já cogita fazer com ela, em alguns anos, o mesmo que foi feito com as brolhas, outro produto artesanal da cidade: organizar cursos. As brolhas são uma tradição de origem portuguesa, na qual pedaços de tecidos são desfiados e seus fios são amarrados como se fossem rendas. Provavelmente, elas vieram dos macramês, trabalhos manuais árabes, cujo nome significa a arte de fazer tramas e dar nós com as mãos.

 

Lucy Fortes Adamovicz, de 62 anos, é uma das cerca de 60 pessoas que fazem brolhas em toalhas, caminhos-de-mesa, cortinas e colchas em Irati. Há sete anos, também dá aulas no projeto Ocupando as Mãos e já formou mais de mil alunas. No momento, tem 138, entre turmas de terceira idade, deficientes físicos e mulheres que aproveitam o artesanato para complementar o orçamento familiar. “Aprendi desfiando sacos de açúcar, torcendo cada três fios com cera ou sabão e amarrando”, recorda. “Hoje, fazemos 160 modelos de brolhas diferentes.”

 

Uma curiosidade: além das brolhas, Lucy faz cerveja preta em casa.

Matéria de Luciana Gardin

 

 

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