Novos estudos revêem efeitos do aquecimento global
Três dos efeitos previstos do aquecimento global podem não ser tão catastróficos
quanto os cientistas imaginavam. Quatro novos estudos trazem resultados
tranqüilizadores sobre a aceleração do degelo na Groenlândia, a probabilidade de
mais furacões no futuro e o impacto da acidificação dos oceanos sobre os
microrganismos marinhos. Tranqüilizadores, mas só um pouquinho.
Dois desses estudos saíram na quinta-feira (17) on-line na revista "Science".
Eles são assinados pelos americanos Sarah Das, do Instituto Oceanográfico de
Woods Hole, e Ian Jouglin, da Universidade de Washington.
Um deles é, na verdade, uma observação assustadora: os cientistas viram um lago
de 5,6 km2 de área, formado pelo degelo da superfície do manto glacial da
Groenlândia, ser esvaziado em 24 horas. Durante uma hora e meia, a água escorreu
por uma fenda a uma vazão de 8.700 metros cúbicos por segundo --mais do que a
das cataratas do Niágara.
Os cientistas sabem que a água do degelo escorre por fendas chamadas "moulins".
Através delas, a água chega até o leito rochoso sobre o qual está assentado o
gelo, lubrificando-o. Isso faz com que a capa glacial escorregue mais depressa.
Os cientistas sabem também que o aquecimento global está aumentando a quantidade
de lagos formados pela água que derrete no verão sobre o gelo. Há o temor de que
os "moulins" produzam uma aceleração catastrófica das geleiras da Groenlândia,
com o desprendimento de icebergs maciços e uma elevação do nível do mar bem
maior do que os 59 centímetros projetados pelo IPCC (painel do clima das Nações
Unidas) até o fim do século.
No entanto, um outro estudo da dupla na mesma edição da "Science" procurou
avaliar o impacto desse efeito na velocidade de escoamento das geleiras do
litoral da Groenlândia.
Os cientistas descobriram que essas geleiras sofrem aceleração muito baixa.
"Tomados juntos, os novos achados indicam que, embora o derretimento na
superfície tenha um efeito substancial na dinâmica do manto de gelo, ele pode
não produzir grandes instabilidades que levem ao aumento do nível do mar", disse
Jouglin.
Loucas por ácido
Outro pesadelo dos cientistas é o efeito do aumento na concentração de CO2 no
oceano sobre os organismos marinhos.
Vários estudos têm mostrado que um mar mais ácido (o gás carbônico em excesso
acidifica a água) inibe a formação de carapaças de calcário (carbonato de
cálcio) pelo fitoplâncton. Isso é um problema, porque, ao formar tais carapaças,
esses micróbios ajudam a "seqüestrar" o carbono do mar. Sem o fitoplâncton, esse
seqüestro diminui e o mundo pode ficar ainda mais quente.
Na edição desta sexta-feira da "Science", a oceanógrafa Debora
Iglesias-Rodríguez, da Universidade de Southampton (Reino Unido), mostra que, ao
menos para uma espécie de fitoplâncton, quanto mais ácido, melhor. Em
laboratório, ela demonstrou que o cocolitóforo Emiliania huxleyi fica maior
quando mais CO2 é dissolvido na água. Como os cocolitóforos em geral respondem
por um terço da produção de carbonato de cálcio no oceano, diz Rodríguez, seu
estudo significa que uma parte desse seqüestro pode não ficar comprometida
--muito embora esse efeito possa estar restrito a uma única espécie de
cocolitóforo.
Furacões
Outra questão que o IPCC deixou sem resolver foi atacada por Kerry Emanuel,
climatologista do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts).
Emanuel e outros têm observado que águas mais quentes (acima de 27C) aumentam a
quantidade de vapor na atmosfera tropical, que é combustível para furacões. Isso
produz tempestades mais poderosas, como o Katrina e o Rita, de 2005. Mas não se
sabia se o número total de tormentas também cresceria. Em estudo publicado na
edição de março do "Boletim da Sociedade Meteorológica Americana", Emanuel diz
que não.
O grupo de Emanuel desenvolveu um método novo que espontaneamente "semeia"
furacões em modelos climáticos de computador. A técnica foi aplicada com sucesso
para reproduzir o número e a intensidade de tormentas nas últimas duas décadas.
No entanto, quando aplicada aos modelos do IPCC, ela simula uma freqüência total
menor de furacões.
Segundo Emanuel, a redução provavelmente ocorre porque o aquecimento global
aumenta a chamada "tesoura de vento", a diferença entre a velocidade dos ventos
na parte mais alta da troposfera. Ventos fortes mais no alto inibem as
tempestades.
O americano Kevin Trenberth, outro especialista em clima e furacões, diz que o
estudo é "novo e interessante, mas requer ajustes". Segundo ele, os modelos
climáticos são muito grosseiros para enxergar o que acontece com as tempestades
que formam os furacões, deixando a atmosfera artificialmente estável. "Há boas
razões para crer que haverá menos furacões, mas eles serão mais intensos quando
ocorrerem", diz.
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